Cerca de meio milhão de brasileiros e brasileiras dizem SIM ao limite da propriedade de terra

20 10 2010

por Assessoria de Comunicação FNRA

O Fórum Nacional pela Reforma Agrária e Justiça no Campo entregou hoje à sociedade brasileira o resultado do Plebiscito Popular sobre o Limite da Propriedade, realizado de 1º a 12 de setembro

Participaram deste plebiscito 519.623 pessoas, em 23 estados brasileiros e no Distrito Federal. Só não participaram do mesmo, Santa Catarina, Amapá e Acre que optaram por fazer o abaixo-assinado, somente. Eram admitidas à votação pessoas acima de 16 anos, portanto em condições de votar.

Duas foram as perguntas formuladas às quais se devia responder sim ou não.

A primeira: Você concorda que as grandes propriedades de terra no Brasil, devem ter um limite máximo de tamanho?

A segunda: Você concorda que o limite das grandes propriedades de terra no Brasil possibilita aumentar a produção de alimentos saudáveis e melhorar as condições de vida no campo e na cidade?

95,52% (495.424) responderam afirmativamente à primeira pergunta, 3,52% (18.223), negativamente, 0,63% foram votos em branco e 0,34%, votos nulos.

Em relação à segunda pergunta os que responderam sim foram 94,39% (489.666), 4,27% (22.158) responderam não, 0,89 % foram votos em branco e 0,45%, votos nulos.

Considerando as dificuldades enfrentadas tanto na produção, quanto na distribuição de um mínimo de material, pela falta de recursos e de pessoal disponível; considerando que o Fórum e outras entidades envolvidas não tiveram acesso a qualquer veículo de comunicação de massas; considerando o momento, quando as atenções estão voltadas e os militantes envolvidos nas campanhas eleitorais, pode-se saudar o resultado como muito positivo.

Mais de meio milhão de pessoas se posicionou afirmativamente em relação à necessidade e à conveniência de se colocar um limite à propriedade da terra. Este é um indicador expressivo de que a sociedade brasileira vê a proposta como adequada. É uma amostragem do que pensa boa parcela do povo brasileiro. As pesquisas de opinião ouvem duas ou três mil pessoas e seus dados são apresentados como a expressão da vontade da sociedade!

Mas o que se pode ressaltar como o mais positivo, e que os números não expressam, é todo o trabalho de conscientização que se realizou em torno do plebiscito. Foi desenvolvida uma pedagogia que incluiu reflexão, debates, organização de comitês, divulgação e outros instrumentos sobre um tema considerado tabu, como é o da propriedade privada.

Em quase todos os estados foram realizados debates em universidades, escolas, igrejas e outros espaços em que se pôde colocar a realidade agrária em toda sua crueza. Para muitos, cujo contato com o campo é praticamente nulo, estes debates abriram um horizonte novo no conhecimento da realidade brasileira. Também se pode saudar como fruto precioso deste processo, os inúmeros trabalhos e textos produzidos pela academia sobre o arcabouço jurídico que se formou em torno à propriedade da terra e sobre aspectos históricos, sociológicos e geográficos da concentração fundiária no Brasil. Não fosse a proposta do plebiscito esta reflexão não teria vindo à tona com a força com que veio.

Este ensaio está também a indicar que um Plebiscito Oficial deveria ser proposto para que todos os cidadãos e cidadãs pudessem se manifestar diante de um tema de tamanha importância para o resgate da cidadania de milhões de brasileiros e brasileiras que lutam, muitas vezes sem sucesso, buscando um pedaço de chão onde viver e de onde retirar o sustento. O Fórum vai continuar firme na luta para que seja colocado um limite à propriedade da terra.

A população brasileira também foi convidada a participar de um abaixo-assinado que continua circulando em todo país até o final deste ano. O objetivo desta coleta de assinaturas é entrar com um Projeto de Emenda Constitucional (PEC) no Congresso Nacional para que seja inserido um novo inciso no artigo 186 da Constituição Federal que se refere ao cumprimento da função social da propriedade rural.

Já o plebiscito popular, além de consultar a população sobre a necessidade de se estabelecer um limite máximo à propriedade da terra, teve a tarefa de ser, fundamentalmente, um importante processo pedagógico de formação e conscientização do povo brasileiro sobre a realidade agrária do nosso país e de debater sobre qual projeto defendemos para o povo brasileiro. Além disso, o Plebiscito Popular pelo Limite da Propriedade de Terra veio como um instrumento para pautar a sociedade brasileira sobre a importância e a urgência de se realizar uma Reforma Agrária justa em nosso país.

A proposta da Campanha Nacional pelo Limite da Propriedade de Terra visa pressionar o Congresso Nacional para que seja incluído na Constituição Federal um novo inciso que limite o tamanho da terra em até 35 módulos fiscais – medida sugerida pela campanha do Fórum Nacional pela Reforma Agrária e Justiça no Campo (FNRA).

Além das 54 entidades que compõem o Fórum Nacional pela Reforma Agrária e Justiça no Campo, também promovem o Plebiscito Popular pelo Limite da Propriedade da Terra, a Assembléia Popular (AP) e o Grito dos Excluídos. O ato ainda conta com o apoio oficial das Pastorais Sociais da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e do Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil (Conic).





Direito Autoral: o que você acha?

7 06 2010

Seminário sobre a reforma da Lei de Direito Autoral no Rio

Local: Fundação Getulio Vargas – Praia de Botafogo, 190, 13 andar (Sala Luis Schuartz)

Data e horário: dia 09 de junho, das 14:00 às 19:00

Programação

Parte I – Contexto da regulação de direito autoral e conceitos básicos

14:00 – Arrecadação e distribuição de direitos – Alexandre Negreiros (SindiMusi)
14:30 – O que é direito autoral? – Denis Borges Barbosa
15:00 –  Limitações e exceções – Marília Maciel (CTS/FGV)
15:30 – Debate
Parte II – Novas tecnologias, produção e acesso a conteúdo
16:00 – Novos modelos de negócio – Olívia Bandeira (Overmundo)
16:30 – Direito de acesso – Guilherme Varella (IDEC)
17:00 – Acesso ao conhecimento e domínio público – Carlos Affonso(CTS/FGV)
17:30 – Debate
18:00 – Encerramento: Cenário político e desafios atuais
Deputado Alessandro Molon (Deputado Estadual – RJ )
Deputado Chico Alencar (Deputado Federal – RJ)
Marília Maciel/Luiz Moncau (CTS/FGV)

As vagas são limitadas. Inscrições para o seminário devem ser feitas aqui: http://direitorio.fgv.br/inscricao-reforma-lei-direito-autoral

Mais sobre a Reforma da Lei do Direito Autoral

http://www.reformadireitoautoral.org/

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Rede lança caderno pela Reforma da Lei dos Direitos Autorais

29 05 2010

A Rede pela Reforma da Lei de Direitos Autorais lançou na última quarta-feira, 26/5, durante ato público promovido no Ministério Público Federal de São Paulo, o caderno “Direito Autoral em Debate”, produzido coletivamente pelas suas 20 organizações integrantes

O caderno trata das relações entre o direito autoral e os recursos educacionais, a produção artística, o acesso à cultura, as possibilidades digitais e os direitos do consumidor. Com ele, a Rede pela Reforma da LDA pretende contribuir com o debate público da legislação autoral e informar o cidadão sobre esse tema cada vez mais presente no seu cotidiano.

O ato-debate, que contou com a presença do Movimento Cineclubista, Música pra Baixar, Associação Paulista de Cineastas, CUCA da UNE O Teatro Mágico, Gpopai, Idec e o CTS da FGV teve como intuito exigir que o Ministério da Cultura coloque o projeto de Reforma da Lei dos Direitos Autorais (9619/98) para Consulta Pública o quanto antes, levando em consideração que trata-se de um ano eleitoral e da Copa do Mundo. Desde a demanda identificada na xx Conferência Nacional de Cultura o Ministério vem acumulando contribuições acerca da reforma da lei. Entretanto, até a data presente o texto não foi liberado pelo MinC para a consulta, para que a sociedade debata de forma ampla e transparente as mudanças que julgar necessárias acerca desse dispositivo.

Fernando Anitelli, da trupe O Teatro Mágico, aproveitou o espaço para refutar o rótulo de “exceção” conferido à banda, que não é vinculada a uma gravadora e disponibiliza suas músicas e vídeos gratuitamente na Internet : “Não somos uma exceção, somos uma possibilidade. A nossa música não nasce do nada, da nossa cabeça. Ela só é possível porque ouvimos outras coisas, consumimos outros produtos culturais. Festivais de música, compartilhamento de conteúdo e encontros presenciais são extremamente necessários”. Fernando também externou sua opinião acerca do Escritório Central de Arrecadação de Direitos Autorais – Ecad, o atual responsável pelo recolhimento dos direitos autorais no Brasil: “como acreditar num órgão que cobra pela execução do ‘Parabéns pra você’?”.

Sobre o Ecad , Claudio Prado, presidente do Laboratório Brasileiro de Cultura Digital ironiza: “Nenhuma instituição que tem 300 advogados pode ser honesta”.


Saiba mais:

http://www.reformadireitoautoral.org/

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A culpa é de São Pedro?

14 04 2010

“É mesmo um caso de amor, desses que ninguém destrói, Jorge Roberto Silveira e o povo de Niterói” – jingle de campanha de Jorge Roberto Silveira à prefeitura de Niterói.

Por Flavia Villa Verde

Nascida e criada em Niterói, foi muito duro pra mim ter vivenciado essa última semana. A chuva que deixou o Estado do Rio de Janeiro davastado teve a cidade de Niterói como uma de suas principais vítimas. Obviamente isso não foi uma implicancia de São Pedro com a cidade mas sim um descuido total do Jorge Roberto Silveira que há alguns anos é o prefeito de Niterói. Depois de alguns dias “ilhada” na Região Oceânica resolvi escrever esse texto como um desabafo.

Moro numa região privilegiada de Niterói, a Região Oceânica. Os acessos que levam até esta área sofreram graves desmoronamentos e a região ficou isolada. Sem internet e telefone, tentei acompanhar todo esse caos pela televisão. Mais uma vez a mídia dominante se mostrou eficiente para aquilo que se propõe: comercializar a pobreza, legitimar o extermínio e ocultar as reais razões dos fatos. Fiquei pensando em como a máquina de captura é eficiente, pricipalmente depois de assistir o Fantástico deste domingo. O programa mostrou durante um tempo significativo cenas de favelas que foram completamente soterradas e as equipes de resgates nesses locais. Depoimentos de pessoas que perderam suas casas, familiares, amigos e histórias fizeram lágrimas rolarem do meu rosto de maneira desenfreada. E é exatamente por isso que eu afirmo que a captura é eficiente. Em nenhum momento da reportagem foi noticiado o que realmente importa: porque essa chuva foi violenta? Quais foram as políticas públicas que foram ignoradas e propiciaram essa tragédia? Porque só filmaram as áreas de risco da população pobre? Quais serão as medidas adotadas agora para essas tantas famílias que estão sem suas casas? Usar o sofrimento humano para tocar as pessoas (comercializando a pobreza) e a partir disso desviar as perguntas essenciais é uma violência tão cruel quanto a força das águas que deixaram o Rio de Janeiro aos pedaços.

A limpa nas favelas é um tema que vem de outros carnavais, ou melhor, de outros jogos esportivos. A chacina ocorrida no Complexo do Alemão em julho 2007, durante o governo do Sérgio Cabral, teve como desculpa a segurança para os jogos pan americanos. Apesar do apoio da mídia dominante e de grande parte da população, esse ato teve como resposta manifestações de repúdio contra essas ações. Com os jogos Olímpicos a caminho foi preciso pensar em novas formas de limpezas (poderia falar das UPP´s mas isso tiraria o foco da onde quero chegar) e de desculpas para as mesmas. Neste sentido parece que as chuvas vieram a calhar, elas estão sendo o evento que precisava para legitimar o extermínio total das favelas. Sou uma pessoa a favor da vida e não nego a necessidade da retirada de famílias de áreas de risco. O que me deixou surpresa foi perceber que no mapeamento das áreas de risco só haviam favelas. E as áreas nobres, porém também de risco, em São Conrado? E as grandes casas da Estrada Froz de Niterói? Repito, não estou negligenciando aqui a necessidade de remoção de certas famílias de suas casas mas acho que devemos pensar cuidadosamente para que não haja uma nova forma para um mesmo extermínio.

Outro ponto que pensei foi sobre as assistências que as autoridades estão dando as famílias que estão sendo removidas. Isto porque, com a ajuda da mídia dominante, mais uma vez, está se implantando a idéia de que os pobres não querem sair de suas casa mesmo sabendo que estas estão em áreas de risco, logo a culpa é deles. Essa premissa poderia até ser considerada verdadeira se não fosse pelo fato do ser humano ocidental ter um histórico de buscar adiar a morte ao máximo (basta prestar a atenção nas tecnologias da medicina) e ser “adestrado” na sociedade pela busca de sua estabilidade (instituição família, o trabalho, os estudos). Se viver no limiar da morte é a “escolha” de algumas pessoas, quais foram as opções dadas a elas? Em Niterói e em Maricá os prefeitos abriram escolas e outros espaços públicos para servirem de alojamentos como medida emergencial. No Rio, Eduardo Paes disponibilizou para algumas famílias uma bolsa de 400 reais durante um ano para cobrir o aluguel de suas moradias (gostaria de saber onde encontrar aluguel a esse valor no Rio de Janeiro). Mais uma vez a população pobre fica vulnerável ao assistencialismo enquanto deveriam estar amparados por políticas públicas. Essa é uma história antiga e que se repete: 1888, a abolição da escravatura é uma data importante marcada por lutas e resistências. Mas também foi marcada por um descaso com os escravos que foram soltos pelas ruas sem amparos de políticas públicas inalgurando no Brasil uma significativa população de rua e também instituições e estratégias de esconder/eliminar essa população.

Um outro ponto é pensar numa chuva tão forte, violenta e inesperada. Assim como tivemos no verão temperaturas acima do normal, estamos passando agora por chuvas também nunca antes vivenciadas. Essas transformações não são ao acaso, isso tem um motivo. O planeta é um grande organismo vivo, um grande sistema. Quando algum fator o desiquilibra, todo o sistema é modificado. A natureza está nos alertando pra algo que já deveriamos estar mais atentos: é necessário ter um olhar ecológico para guiar nossas vidas. Para isso é preciso consciencia ambiental (educação, no mais amplo sentido da palavra. Educação nas escolas, educação dos afetos – percebendo a si e ao outro -, educação para compreender as diversidades e a vida). Também é preciso modificar o modelo capitalista/do consumo que vivemos e isto é uma tarefa do cotidiano, dos hábitos. Todas as leis, os modelos, as culturas, as moralidades e imoralidades dentre tudo que nos cerca na vida foram construidas por nós, seres humanos. Por isso temos que nos perguntar que tipo de sociedade queremos, de fato, construir. Com essa fala eu não quero desculpabilizar prefeitos, governador e presidente e colocar a “culpa” da chuva no povo. Muito pelo contrário, quero reforçar que a ecologia é uma linha que caminha junto com a política, elas são a solução – ou não – para o nosso país. Por isso é necessário prestar a atenção nas ações e propostas de candidatos, principalmente neste momento de eleição.

Para finalizar gostaria de comentar sobre a fala do secretário de obras de Niterói, Mocarzel. Quando questionado sobre o porque de Niterói ter sido a área mais devastada de todo o estado do Rio de Janeiro, ele respondeu que isso aconteceu pelo fato de Niterói ser espaço geográfico com muitas montanhas e pelas chuvas tão fortes e inesperadas. A explicação dele teria sido irônica se o assunto não envolvesse tantas vidas. Como secretário de Obras e Serviços Públicos, diretor da Fundação Parques e Jardins e conselheiro da Secretaria estadual de Urbanismo e subsecretário estadual de Integração Social, eu esperava dele apenas a sinceridade: problemas devido a especulação imobiliária, pelas obras “furrecas” para uma boa aparência a cidade e um descuido com aqueles que só são cidadãos de direito quando convém.

O caso de amor entre Jorge Roberto Silveira e o povo de Niterói, que já estava destruido há muito tempo mas que só foi trazido a tona agora precisa ser rompido de vez! Apesar de achar que ele tem responsabilidades neste caso da chuva, não o culpo como único elemento nesta história, mas acredito que ele é um simbolo forte que ajuda em uma típica crença niteroense: “Sr. Prefeito Fulano pode até … mas pelo menos ele faz”. Vamos parar com isso galera! Vamos “aproveitar” essa tragédia pra nos fortalecer e lutar, cada dia mais, por uma sociedade que respeite a vida e legitime os direitos sociais. Vamos gritar, denunciar, exigir e transformar.





Tornar o Luto uma luta

8 04 2010

A grande mídia, mesmo diante de uma catástrofe jamais vista, após a forte chuva de segunda-feira, culpa os próprios moradores dos morros atingidos em todo o Estado do Rio de Janeiro. A principal política dos governos estadual e municipais (cujo discurso de culpar os moradores de favela encontra eco na mídia grande) é reforçar o choque de ordem e só se preocupar em remover as famílias de suas casas, já que “o solo urbano é propriedade das prefeituras”. Crueldade sem fim e desfaçatez para não admitir a própria ganância e irreponsabilidade com a população. Trazemos aqui o relato de Daniel Nunes, professor do pré do Morro do Estado, na mais castigada cidade do estado pela inundação, Niterói. Estaremos com novas notícias a qualquer momento… Revista Vírus Planetário

Tragédia anunciada… E agora prefeito?

Niterói passa por uma situação calamitosa. Se por um lado setores da cidade sofrem com o grande inconveniente de situações como alagamentos, falta luz e imobilidade, o que já é grave, outras partes possuem milhares de desabrigados (até o momento são mais de 3 mil), centenas de feridos, dezenas de mortos. Além da enorme força da natureza, essa chuva exorbitante demonstrou a gravidade da situação social da cidade.

Acompanho pessoalmente a situação do Morro do Estado. Foram vários os deslizamentos e abalos no Morro do Estado, Morro do Arroz e no Morro da Chácara (todos dentro do Complexo do Morro do Estado). Os números frios: 4 mortos, sendo um menino ainda soterrado; dezenas de feridos; e mais de 80 famílias desabrigadas. O pior deslizamento ocorreu aproximadamente às 7:30 da manhã de terça-feira (dia 6) e causou além de outras tristezas, as mortes mencionadas. Um bar e umas 5 casas foram totalmente destruídas. Mas os deslizamentos foram ainda muitos outros, pequenos ou médios, e com isso muitas outras casas estão comprometidas ou destruídas.

O socorro foi muito precário, sendo conduzido, durante muito tempo, pelos próprios moradores, e mesmo com a chegada dos bombeiros, a militância solidária da comunidade foi muito necessária. Acompanhei parte do resgate nesta terça-feira junto a Madureira e Tão, dois amigos, que acompanharam tudo desde o início enquanto moradores da favela e dirigentes da Associação de Moradores do Morro do Estado (AMME). Desde os primeiros minutos do desmoronamento, passando pelo resgate, até as altas horas de terça e o dia todo de quarta-feira, junto com muitos moradores, eles ajudaram conduzir a gestão de toda essa situação na favela para conseguir abrigo e outras condições mínimas para vizinhos próximos e mais distantes.

Só não enxerga quem não quer! Existe um abismo social na cidade, que fica ainda mais evidente em situações como as fortes chuvas.

O que os governantes têm dito sobre assunto? Quem mora em situação de risco, mora porque quer; quem mora em situação irregular, assim está por irresponsabilidade própria; os estragos são causados unicamente pela chuva além da média. Tudo mentira! As pessoas moram nesses lugares porque não têm condições de viver em outro lugar, não possuem condições de pagar. No Morro do Estado, por exemplo, a população é paupérrima, sua imensa maioria é composta de trabalhadoras e trabalhadores que ganham seu pão de cada dia, fazendo a cidade funcionar, na formalidade ou na informalidade. Moram ali boa parte daqueles que abrem e fecham portões de prédios, limpam as ruas, faxinam as casas, atendem em lojas, servem as mesas, vendem CD’s, DVDs, enfim, trabalham principalmente no setor de vendas e serviços.

Apesar disso, onde moram estão alheios ao serviço de saneamento, de educação, de cultura, de serviços de saúde… é só subir e contar o número de escolas, teatros, postos de saúde, para atender à população de mais 30 mil pessoas que residem no Complexo do Morro do Estado, majoritariamente jovens ou muito jovens. Difícil é encontrar e não contar.

São várias as favelas e comunidades pobres de Niterói em situação semelhante há muitos e muitos anos. Não é de se admirar que nada mude quando nos deparamos com o planejamento orçamentário de Niterói e seu uso efetivo. Recebi do SEPE-Niterói um texto crítico, do qual destaco o seguinte trecho:

“Até outubro de 2009, dos R$866.549.857, 90 do orçamento previsto pela Prefeitura, foi efetivamente gasto R$ 699.833.160, 00, ou seja, 80,76% do total. Em relação às verbas destinadas ao Saneamento Básico Urbano, de apenas R$11.106.720, 00, foram gastos R$5.883.570, 00, 44,94% do previsto. Ou seja, a Prefeitura de Niterói gastou efetivamente apenas 0,67% do seu orçamento total previsto em Saneamento básico.

Em relação à Habitação, somando as verbas específicas, e as alocadas na área de Urbanismo, era previsto o gasto de R$2.385.000,
00, mas efetivamente foram gastos apenas R$65.917,00; 2,76% do previsto.

Enquanto isso, com a Câmara Municipal de Niterói foi previsto um orçamento de R$32.897.000, 00 e gasto efetivamente R$29.076.283, 30, 88,39% do seu total. A Prefeitura de Niterói gastou, até outubro de 2009, 3,4 vezes mais com a Câmara Municipal de Niterói do que com Saneamento Básico em nossa cidade. Somando o aumento de cargos comissionados, Secretarias
Regionais, Conselho Consultivo, etc, a dimensão da disparidade entre a prioridade dada aos aliados políticos da Prefeitura, e os investimentos sérios nas áreas em que nossa população realmente precisa, é gigantesca.”

Fico contente com o manifesto muito pertinente lançado pelo SEPE-Niterói (abaixo a íntegra do manifesto), que confirmou presença no Morro do Estado dia 8 pela manhã. Às 10 da manhã temos uma Assembléia Geral Extraordinária do Morro do Estado. Além de organizar todo o processo de abrigo e de coleta de auxílios diversos (cujos locais de arrecadação serão devidamente divulgados), a Assembléia marcará um ato público, a princípio para terça-feira próxima, às 16 horas, em frente à Prefeitura de Niterói, para denunciar o descaso do poder público municipal com a cidade, principalmente com a sua maioria pobre, e cobrar as providências de caráter emergencial e estrutural.

Torço para que Niterói torne seu luto em luta.

Relato de Daniel Vieira Nunes

Professor de História do Pré-vestibular Popular do Morro do Estado.

Conselheiro Universitário da Universidade Federal Fluminense pela bancada estudantil

OBS.: Enquanto escrevo escuto as notícias do Morro do Bumba, no Fonseca, que teve o pior deslizamento desses dias tristes.





Chuvas no Rio: nem tudo vale a pena

7 04 2010

Por Paulo Piramba

Os números realmente impressionam. Em menos de 12 horas choveu na cidade do Rio de Janeiro, e em parte de sua Região Metropolitana, o equivalente a dois meses de chuva. Uma média de 270mm, enquanto o índice normal para o mês de abril é de 140mm. Até o momento em que escrevo, já foram confirmadas pelo menos 95 mortes.

A causa mais imediata para esse extremo climático de gigantesca proporção é a combinação de uma frente fria, com o contraste entre o ar polar e o ar quente tropical, aliado à temperatura do mar, 2ºC mais quente do que o normal. Além disso, a maré alta contribuiu para que o alagamento das áreas urbanas do Rio, já muito impermeabilizadas, não escoasse.

Além do triste saldo de mortes, quase todas provocadas por deslizamentos de encostas, o caos se instalou na cidade. O alagamento das vias impediu a passagem dos veículos, fazendo com que milhares de pessoas não chegassem em casa. Muitos dormiram na rua essa noite. Nessa terça-feira, a cidade vive um feriado forçado, já que escolas, universidades e poder judiciário suspenderam suas atividades. Mas muitos bancos, lojas e escritórios de grandes e pequenas empresas também não funcionam, já que seus empregados e clientes não têm como se locomover. As já normalmente ineficientes empresas privadas de fornecimento de energia contabilizam milhares de casas sem luz desde a noite de segunda.

O prefeito do Rio coloca a culpa do colapso da cidade “nas fortes chuvas, na maré alta, na ocupação irregular das encostas e nas pessoas que insistem em morar nelas”. Não deixa de alfinetar os “demagogos de plantão” que, segundo ele, “criticam os reassentamentos de moradores de áreas de risco”. E ainda dá “nota zero para o preparo da cidade para o temporal”.

Em meio a todo o oba-oba da realização da Copa do Mundo e das Olimpíadas no Rio de Janeiro, os ambientalistas mais críticos – que responsabilizam a sociedade do consumismo e as suas relações com o meio ambiente, pela escalada do aquecimento global – insistem que, ao invés de obras de fachada, fossem incluídas na preparação destes eventos intervenções que começassem a preparar a cidade para os efeitos que, certamente, as mudanças climáticas provocarão.

Senão vejamos, o que se espera como resultado do aumento da temperatura média do planeta, em um futuro cada vez mais presente, são exatamente temporais muito mais intensos, em duração e amplitude. O mar, além de mais aquecido, estará em um nível superior ao de hoje, dificultando o escoamento, tanto das águas pluviais, como dos esgotos, pelo envelhecido sistema de escoamento das cidades.

Ao invés de investir na adaptação do Rio de Janeiro aos problemas que afligirão a cidade daqui a algumas décadas, as autoridades de todos os níveis preferem alocar recursos em PACs cosméticos, que não vão alterar as precárias condições de habitação da população mais pobre da cidade. Em intervenções desastradas no ineficiente sistema de transporte público, como a linha 1A do Metrô. Ou então transferindo a culpa para a natureza ou, o que é mais revoltante, para as próprias pessoas que moram em locais em permanente risco e precarização ambiental.

Em décadas de militância nunca vi nenhum morador dessas áreas afirmar que gosta de morar ali onde está. Nunca vi ninguém expor, por opção própria, sua família a uma vida sem água, sem esgoto, sem moradia digna e em permanente risco. O que vi, e continuo vendo, são milhões de pessoas obrigadas a ocupar estes territórios, por força de uma política econômica que achata salários e precariza empregos.

São não-cidadãos colocados à margem da sociedade, invisíveis e tratados como peças de reposição das engrenagens do mercado, para serem usados se e quando necessário. Pessoas confinadas em guetos, onde o Estado só se faz presente através da repressão policial, sem saúde e educação. E que, ao invés de serem alvo de políticas habitacionais que lhes permitam conseguir uma habitação digna, são alocadas e realocadas de acordo com a vontade da especulação imobiliária. As casas do PAC racharam com a primeira chuva. Substituir uma precariedade por outra, não é solução do problema. É troca de cativeiro.

As autoridades do Rio, além de criminalizarem a pobreza, também vêm responsabilizando os moradores de comunidades pela degradação ambiental da cidade. No Rio, muros de confinamento têm sido erguidos sob o álibi de impedirem que os moradores desmatem as encostas. Mas qualquer levantamento por satélite mostra que são os condomínios e mansões que estão ocupando as encostas acima da cota 100, destruindo a Mata Atlântica.

O real objetivo é “limpar” o Rio para que se transforme cada vez mais numa cidade-espetáculo para os ricos, palco de grandes eventos, como desejam hoje autoridades e empresários. Não é mais suficiente condenar milhões à invisibilidade do não-acesso à sociedade do consumo. É necessário varrê-los para baixo do tapete, escondê-los fisicamente com os tapumes da Linha Vermelha, expulsá-los para o mais longe possível, para que as áreas onde eles hoje estão sejam “revitalizadas”, como se lá nessas comunidades não houvesse vida.

Ao longo da história, as cidades vêm perdendo sua referência territorial por conta e obra das exigências dos mercados. Ocupar áreas de mangue aterradas ou de várzea, e depois lamentar as inundações tornou-se freqüente. Incentivar o consumo desenfreado, e depois não saber onde colocar o lixo, também. Permitir que as indústrias utilizem e poluam a maior parte da água potável, e depois sofrer com a sua escassez vai se tornando uma norma.

Vivemos em um planeta à beira de uma ameaça que pode colocar em risco a sobrevivência das espécies, entre elas, a humana. O sistema que polui águas, solos e ar, que vem dilapidando as riquezas naturais e causando uma devastação ambiental dramática, tem a capacidade de destruir também o equilíbrio do clima. Tudo isso pela utilização de modos de produzir e combustíveis que agridem a natureza. Têm valido a pena?

* Paulo Piramba, 55 anos, é membro da Rede Ecossocialista Internacional e do Instituto Búzios.

Fonte: Agência Petroleira de Notícias





A necessidade do funk

3 12 2009

Por Adriana Facina do Oicult

Durante uma festa da campanha para a eleição do deputado Marcelo Freixo, ocorrida em Niterói, o DJ tocou um set de funk. Comecei a dançar com alguns amigos e logo ouvi de alunos meus presentes no local: “nossa, professora, você dança funk?”. E brincaram: “Facina é um quadro de massas!”. Na época eu nem pesquisava o funk ainda, mas disse: “o funk é muito bom e, além disso, como vamos dialogar com a juventude pobre sem ele?” O pessoal respondeu: “mas o funk é machista!”. E eu: “qual gênero musical está livre de machismo? Até Chico Buarque!” Nessa hora, tocava o clássico hino funkeiro “Eu só quero é ser feliz…”. Eu: “ e essa música aí, é machista?”. Eles: “ah, professora, mas é uma plataforma política muito recuada… muito conformista…” Eu ainda argumentei: “isso é porque vocês não sabem como é difícil andar tranquilamente na favela sendo favelado…”
Anos depois, recebo emails de alguns desses mesmos alunos convidando para rodas de funk e vejo várias daquelas carinhas nas escadarias da ALERJ no dia da votação dos projetos de lei do funk. Fiquei muito feliz, pois percebi que não eram somente as leis que estavam mudando, mas também as opiniões de muitas pessoas, inclusive da esquerda, sobre o som que vem das favelas.
Na UFF, no Instituto de Ciências Humanas e Filosofia, os estudantes sempre debatiam se se podia ou não tocar funk nas calouradas e outras festas organizadas por eles. A galera mais à esquerda, com poucas exceções, defendia que não, pois o funk era “música de playboy”, preconceituoso, rebaixava as mulheres e assim por diante. Volta e meia esse debate surgia na minha sala de aula. Quando o Movimento Funk é Cultura e a APAFunk começaram a organizar as rodas de funk na UFF, as coisas foram mudando. As rodas de funk são um espaço de encontro e de troca entre os profissionais do funk e uma mídia alternativa para divulgação daquela produção funkeira que não toca nas rádios. Nas palavras do MC Leonardo, as rodas de funk são uma “manifestação político-cultural”. Houve rodas de funk em várias festas e encontros estudantis, inclusive no Encontro da Juventude do Campo e da Cidade, organizado pela Via Campesina em 2008. Da UFF, elas se espalharam por outras universidades: UFRJ, UERJ, PUC, UNIRIO e até na UNICAMP. Junto das rodas, sempre rolavam debates sobre a criminalização do funk e da pobreza, sobre os direitos dos artistas, sobre a linguagem do funk numa intensa troca de saberes e experiências entre universitários e funkeiros
A meu ver, essa foi uma das maiores vitórias da APAFunk: sensibilizar movimentos sociais e a esquerda como um todo para a defesa de uma manifestação cultural legítima do povo favelado, explicitando como a criminalização dessa cultura está de braços dados com a criminalização da pobreza.
A vitória do funk na ALERJ, ocorrida no dia 01 de setembro, não teria sido possível sem isso. Foi assim que se deu a aproximação fundamental com o mandato do deputado estadual Marcelo Freixo (PSOL), que tornou realidade, com muita negociação e esforço, a derrubada da Lei “Álvaro Lins”, que impossibilitava a realização dos bailes, e a aprovação da lei que define o funk como manifestação cultural. Com o plenário lotado e com as escadarias tomadas de funkeiros, favelados, universitários, sem-terra, professores da rede pública, militantes de diversos movimentos sociais, os deputados foram pressionados, de olho já nas eleições, a aprovar as leis. Vimos, incrédulos, o líder do governo dizer que errou, fazer uma mea culpa pública, dando, sem querer, uma aula sobre como se faz a política institucional no Brasil hoje. Foi uma grande festa cidadã!
A mídia gorda, como de costume, noticiou o que quis e tirou o protagonismo da APAFunk e dos movimentos sociais nesse processo. Mas, mesmo assim, a definição do funk como cultura se tornou o centro dos debates em todo o estado. Uma amiga minha, professora da rede pública em Itaboraí, disse que seus alunos adolescentes vibraram com a notícia e se sentiram muito felizes de ver a música com a qual se identificam tratada como questão cultural e não como caso de polícia. Entre os profissionais do funk, a postura inicial de descrédito (quantas vezes ouvimos “isso não vai dar em nada”) e mesmo desconfiança da maioria virou auto-estima e certeza de que a organização coletiva tem poder. Também entre os amigos do funk, uma onda de otimismo e confiança alimentou os sonhos construídos na luta coletiva, pois a possibilidade da transformação estava ali, acontecendo diante dos olhos de quem quisesse ver. Como disse Marcelo Freixo, a vitória do funk nos coloca diante da perspectiva de repactuar a cidade do Rio de Janeiro em novas bases e isso diz respeito a todos os cidadãos, não somente aos funkeiros.
No entanto, nem todas as vozes foram de aprovação. Como era de se esperar, as notícias dos jornais despertaram a ira dos conservadores. Nos comentários on line e nas cartas dos leitores, xingamentos, preconceitos, o funk associado ao crime e à pornografia, acusações, estigmatização do povo favelado. Numa estranha e inesperada aliança, vozes da esquerda também se levantaram para deslegitimar a vitória do funk e para diminuir o significado e as conseqüências políticas dos acontecimentos de 01 de setembro. A presença dos empresários do funk, que visivelmente vieram a reboque do movimento e nos 45 minutos do segundo tempo, foi lida como capitulação da APAFunk. Rapidamente, comparações com a CUFA e o Afroreggae surgiram, mesmo com a associação tendo sido fundada há menos de um ano e não possuindo nenhuma fonte de financiamento. A reunião com o governador Sérgio Cabral para garantir o sancionamento da lei foi vista como aproximação política oportunista com o governo que mata favelados. Esse “fogo amigo”, que serve tão bem aos interesses dos verdadeiros inimigos de classe, dá o que pensar. Acostumados há tantos anos a falarmos só com nós mesmos, nós dos movimentos de esquerda temos dificuldade em lidar com a contradição, em entender que consciência política não é algo nato e que estamos num processo de disputa ideológica duríssimo. A construção de um campo político de esquerda dentro do funk depende de um trabalho árduo no qual temos de lidar com diferenças que, dentro dos esquemas interpretativos tradicionais, podem nos parecer pouco compreensíveis. Por enquanto, o que a maioria dos funkeiros quer é poder viver de seu trabalho e se for um grande empresário ou um político de direita a oferecer isso será com eles que a galera vai fechar.
Por isso, é necessária uma união muito forte entre os amigos do funk. E ela não pode ser somente retórica e muito menos marcada pela intolerância. Construir movimento de massa de modo democrático excluindo a contradição é impossível. Além da formação política, temos de inventar modos de ganhar a vida, interferir na produção funkeira, disputar a mídia, fazer “os nossos” ganharem visibilidade. Esse movimento só vai se fortalecer assim. Não adianta ficarmos pregando a revolução. Ela tem de ser uma realidade e viver no cotidiano das pessoas que só querem ser felizes. Ou a gente mantém os ouvidos atentos, a mente aberta, o espírito criativo pra fazer política sem manuais pré-estabelecidos ou então continuaremos a falar somente pra nós mesmos, naqueles velhos jargões que ninguém agüenta mais ouvir.
E uma coisa é certa: é impossível hoje, no Rio de Janeiro, pensar em fazer movimento de massa com a juventude favelada sem o funk. A necessidade do funk é de primeira ordem pra transformar essa sociedade pavorosa em que vivemos. È mais fácil continuarmos nos nossos guetos ideológicos, entendendo como alienação e cooptação as contradições desse movimento, do que sujarmos nossas crenças arraigadas, nossa dureza de militantes cheios de boas convicções no barro das incertezas políticas geradas por elas. Mas esse barro é só o que temos se de fato quisermos nos comunicar com os sujeitos históricos que podem protagonizar a necessária transformação. Como ele será moldado, depende da nossa capacidade de estabelecer de fato um diálogo em bases democráticas e da nossa paciência em compreender que o tempo dos processos históricos concretos não é o dos nossos desejos. Solidariedade, companheirismo, compreensão, ajuda mútua são valores constitutivos da sociabilidade da classe trabalhadora e podem ajudar na construção de um campo político-cultural transformador no qual o funk necessariamente terá papel fundamental.





Por que o funk é tema de audiência?

24 08 2009

Há mil e um motivos para a realização da audiência pública sobre o funk na Assembleia Legislativa do Rio. Na próxima terça-feira (25/8), às 10h, a Comissão de Defesa dos Direitos Humanos e da Cidadania da Alerj vai conduzir importante discussão sobre as políticas públicas que podem e devem ser adotadas em relação ao funk. Esse debate exige que se vá além da fronteira do preconceito da sociedade que sustenta a repressão oficial, por meio da ação da Polícia, a essa manifestação cultural.



O objetivo dessa audiência será justamente o de promover o avanço do debate sobre o funk por novos ângulos que não apenas o da esfera da segurança pública. “A proposta é por em questão oportunidades de se promover o funk como um instrumento pedagógico a ser utilizado nas escolas ou de se criar, por exemplo, oficinas profissionalizantes para formação de DJs. Esse é o caminho para o Estado reconhecer que o funk existe desvinculado do crime”, defende o deputado estadual Marcelo Freixo (PSOL).



As secretárias de Cultura do Estado, Adriana Rattes, e do município, Jandira Feghali, assim como a secretária estadual de Educação, Teresa Porto, vão participar da audiência. Também a artista Fernanda Abreu e os antropólogos Hermano Vianna e Adriana Facina, dedicados a pesquisas sobre o funk e militantes da causa, vão contribuir para o debate. Os funkeiros serão representados por MC Leonardo, presidente da Associação dos Profissionais e Amigos do Funk (APAFunk) e autor do Rap das Armas, da trilha sonora do filme Tropa de Elite.



A luta de resistência do movimento funk é pacífica e tem se pautado tanto pela firmeza como pelo recurso às instâncias legais de negociação com o Estado e a própria polícia. E há conquistas relevantes nesse rumo, como a autorização da Polícia Militar enfim obtida para a realização de uma roda de funk no Morro Santa Marta, em Botafogo. A roda mobilizou, no mês passado, mais de 500 funkeiros, moradores e militantes de movimentos sociais e organizações de Direitos Humanos. A roda havia sido proibida por duas vezes consecutivas desde junho deste ano.



A perseguição ao funk hoje é concreta. Há três semanas, por exemplo, policiais militares fuzilaram um equipamento de som no Morro do Borel, na Tijuca, sob a hipótese equivocada de que a aparelhagem pertenceria a funkeiros, quando, na verdade, seria utilizada em um evento evangélico cristão. Em 2008, a Alerj aprovou lei do deputado estadual, mais tarde cassado, Álvaro Lins, que, de tantas restrições para a sua autorização, praticamente proibiu o funk no estado. O deputado Marcelo Freixo propôs projeto de lei para revogar essa lei, assim como propôs outro projeto para garantir a liberdade ao funk e o seu reconhecimento como uma legítima manifestação cultural popular.



Organizados na Associação dos Profissionais e Amigos do Funk (APAFunk), que promove a campanha Funk é Cultura, um grupo de funkeiros tem realizado debates e rodas de funk de raiz, para a conscientização da sociedade, em espaços públicos, no asfalto e nas favelas, e também nas universidades do Rio. Trata-se, essa luta do funk pelo direito à voz, de uma questão de Direitos Humanos.



Desde que o batidão chegou ao Rio, nos anos 80, foi identificado como o som dos jovens negros e favelados. E desde o início de sua trajetória, o gênero popular enfrentou a perseguição policial. Acusado de fomentar a violência entre gangues da periferia, expulso das quadras dos clubes de periferia, o funk ficou confinado nos morros, onde passou a ser condenado como instrumento de apologia ao tráfico de drogas e, mais recentemente, da pornografia.



Para mostrar que o funk não inventou nem o tráfico de drogas e nem a prostituição e que é muito mais do que a sociedade imagina, a APAFunk promove as rodas de funk de raiz, assim chamadas em analogia às rodas de samba, outro gênero que já sofreu com o preconceito e a criminalização.



Nesta década, o funk desceu os morros, conquistou o asfalto, as boates da Zona Sul, cenas protagonizadas pelo núcleo rico da novela das oito A Favorita e até mesmo já surgiu uma funkeira oriunda da alta sociedade carioca. Mas a proibição ao funk ainda existe.



Existe ainda, no entanto, só para os jovens pobres e negros das favelas e periferias.





Audiência Pública e Ato-show mobilizam movimento pró-Conferência de Comunicação no Rio

25 06 2009

Da Assembléia Legislativa às praças públicas, organizações sociais do Rio de Janeiro apostam na mobilização popular para transformar o modelo concentrado de comunicação no país

Fonte: Agência Petroleira de Notícias
Fotos: Gilka Resende (ato-show) e Rafael Duarte (audiência pública) – Agência Petroleira de Notícias

Só com muita gente nessa luta será possível vencer o bloqueio da grande mídia. Essa é a reflexão que fez ontem o movimento pró-Conferência de Comunicação colocar cerca de 200 pessoas no Plenário da Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro e movimentar muitos artistas, estudantes e cidadãos em geral para ato-show na Praça de Domingos, em Niterói.

Na audiência pública pró-Conferência Estadual de Comunicação solicitada pela comissão Rio pró-Conferência (movimento que reúne mais de 30 organizações sociais), a participação popular foi boa, mesmo a atividade acontecendo no meio da tarde, horário ingrato para a maioria dos trabalhadores. A mesa da atividade contou com dois representantes do comissão Rio, Oona Castro do Intervozes e o professor Marcos Dantas da PUC-Rio, a deputada federal Cida Diogo, integrante da comissão organizadora nacional da Confecom, e do deputado estadual Gilberto Palmares, além do presidente da Comissão de Cultura da Alerj, o deputado Alessandro Molon, que mediou os trabalhos.

Ausência do Governo do Estado preocupa

O debate foi muito rico, com falas vibrantes tanto da mesa quanto da platéia da necessidade de mudar o modelo de comunicação em nosso país e do papel mobilizador que a conferência nacional pode cumprir. O grande destaque negativo, porém, foi a ausência total do poder executivo estadual. Considerando que o principal motivador dessa audiência era garantir o comprometimento do Governo do Rio de Janeiro nesse processo conferencial, a atividade ficou com esse grande déficit. Os informes da organização nacional, trazidos pela Cida Diogo, explicaram como funcionará a convocação das conferências estaduais. Os governadores e prefeitos têm até o dia 1º de agosto para formalizar as Conferências Estaduais e Municipais, caso não o façam, as Assembléias Legislativas e Câmaras de Vereadores assumem essa atribuição até o dia 5 de agosto. A partir daí, caso nenhuma das duas instâncias do poder público tenham tomado atitude, a sociedade civil pode organizar o processo.

A deputada federal ainda avisou que, embora possam ocorrer conferências municipais, livres e virtuais, apenas no espaço conferencial estadual serão eleitos delegados. Essa informação pode esvaziar muito a mobilização municipal e ainda dificultar a representação do interior nas discussões. Ainda mais que com o corte executado pelo Governo Federal no orçamento da Conferência Nacional de Comunicação, os recursos anteriormente aprovados de 8,2 milhões foram reduzidos para 1,6, o apoio para deslocamento dos movimentos do interior para as conferências estaduais deve ser bastante limitado.

Apresentações artísticas e panfletagem tomam praça universitária em Niterói

Ao término da audiência pública, representantes de entidades e movimentos sociais se deslocaram para Niterói onde ocorreu uma manifestação cultural pró-conferência. No trajeto, pela Praça XV, Barcas e centro de Niterói, os militantes aproveitaram para entregar panfletos sobre a Conferência e convidar os pedestres para aderirem ao movimento pela democratização da comunicação. Ao chegar na Praça de São Domingos, em frente a histórica Cantareira em Niterói, o palco já estava armado e os artistas passavam o som. Por volta de 19h, Claudio Salles, da comissão pró-Conferência de Comunicação de Niterói e do movimento cultural Pop Goiaba, anunciou a abertura do show. Muita música, esquetes, poesia, mostra de jornais alternativos, sempre entremeadas de falações e panfletagem em defesa de uma conferência de comunicação ampla, democrática e transformadora. Faixas e banner pela conferência, contra a baixaria na TV e em defesa da comunicação comunitária se destacavam na praça.

Próximas atividades

No encerramento, os organizadores ainda destacaram que aquela mobilização ali teria que se espalhar pelo país todo. Além da reunião da comissão pró-Conferência estadual, marcada para segunda-feira, 29 de junho, às 19h, no Clube de Engenharia (Av. Rio Branco, 124, 21º andar, no Centro do Rio), haverá uma audiência pública no dia 10 de julho, sexta, na Câmara de Vereadores de Niterói (na Av. Amaral Peixoto), para formalizar o processo da Conferência Municipal de Comunicação.

Antes ainda acontece um encontro de formação preparatória para a Confecom organizado pelo Núcleo Piratininga de Comunicação com o tema ‘Rádio e TV são concessões públicas. Que processos de concessão queremos?’. A atividade é 24/06 (quarta-feira) às 19h, no Sindicato dos Engenheiros (Av. Rio Branco 277, 17° andar – Cinelândia).

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Audiência Pública e Ato-show mobilizam movimento pró-Conferência de Comunicação no Rio Imprimir E-mail

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Atualizado em 23/06/09 12:30  
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Da
Assembléia Legislativa às praças públicas, organizações sociais do Rio
de Janeiro apostam na mobilização popular para transformar o modelo
concentrado de comunicação no país

Fonte: Agência Petroleira de Notícias
Fotos: Gilka Resende (ato-show) e Rafael Duarte (audiência pública) – Agência Petroleira de Notícias


com muita gente nessa luta será possível vencer o bloqueio da grande
mídia. Essa é a reflexão que fez ontem o movimento pró-Conferência de
Comunicação colocar cerca de 200 pessoas no Plenário da Assembléia
Legislativa do Rio de Janeiro e movimentar muitos artistas, estudantes
e cidadãos em geral para ato-show na Praça de Domingos, em Niterói.

Na
audiência pública pró-Conferência Estadual de Comunicação solicitada
pela comissão Rio pró-Conferência (movimento que reúne mais de 30
organizações sociais), a participação popular foi boa, mesmo a
atividade acontecendo no meio da tarde, horário ingrato para a maioria
dos trabalhadores. A mesa da atividade contou com dois representantes
do comissão Rio, Oona Castro do Intervozes e o professor Marcos Dantas
da PUC-Rio, a deputada federal Cida Diogo, integrante da comissão
organizadora nacional da Confecom, e do deputado estadual Gilberto
Palmares, além do presidente da Comissão de Cultura da Alerj, o
deputado Alessandro Molon, que mediou os trabalhos.

Ausência do Governo do Estado preocupa

O
debate foi muito rico, com falas vibrantes tanto da mesa quanto da
platéia da necessidade de mudar o modelo de comunicação em nosso país e
do papel mobilizador que a conferência nacional pode cumprir. O grande
destaque negativo, porém, foi a ausência total do poder executivo
estadual. Considerando que o principal motivador dessa audiência era
garantir o comprometimento do Governo do Rio de Janeiro nesse processo
conferencial, a atividade ficou com esse grande déficit. Os informes da
organização nacional, trazidos pela Cida Diogo, explicaram como
funcionará a convocação das conferências estaduais. Os governadores e
prefeitos têm até o dia 1º de agosto para formalizar as Conferências
Estaduais e Municipais, caso não o façam, as Assembléias Legislativas e
Câmaras de Vereadores assumem essa atribuição até o dia 5 de agosto. A
partir daí, caso nenhuma das duas instâncias do poder público tenham
tomado atitude, a sociedade civil pode organizar o processo.

A
deputada federal ainda avisou que, embora possam ocorrer conferências
municipais, livres e virtuais, apenas no espaço conferencial estadual
serão eleitos delegados. Essa informação pode esvaziar muito a
mobilização municipal e ainda dificultar a representação do interior
nas discussões. Ainda mais que com o corte executado pelo Governo
Federal no orçamento da Conferência Nacional de Comunicação, os
recursos anteriormente aprovados de 8,2 milhões foram reduzidos para
1,6, o apoio para deslocamento dos movimentos do interior para as
conferências estaduais deve ser bastante limitado.

Apresentações artísticas e panfletagem tomam praça universitária em Niterói

Ao
término da audiência pública, representantes de entidades e movimentos
sociais se deslocaram para Niterói onde ocorreu uma manifestação
cultural pró-conferência. No trajeto, pela Praça XV, Barcas e centro de
Niterói, os militantes aproveitaram para entregar panfletos sobre a
Conferência e convidar os pedestres para aderirem ao movimento pela
democratização da comunicação. Ao chegar na Praça de São Domingos, em
frente a histórica Cantareira em Niterói, o palco já estava armado e os
artistas passavam o som. Por volta de 19h, Claudio Salles, da comissão
pró-Conferência de Comunicação de Niterói e do movimento cultural Pop
Goiaba, anunciou a abertura do show. Muita música, esquetes, poesia,
mostra de jornais alternativos, sempre entremeadas de falações e
panfletagem em defesa de uma conferência de comunicação ampla,
democrática e transformadora. Faixas e banner pela conferência, contra
a baixaria na TV e em defesa da comunicação comunitária se destacavam
na praça.

Próximas atividades

No encerramento, os
organizadores ainda destacaram que aquela mobilização ali teria que se
espalhar pelo país todo. Além da reunião da comissão pró-Conferência
estadual, marcada para segunda-feira, 29 de junho, às 19h, no Clube de
Engenharia (Av. Rio Branco, 124, 21º andar, no Centro do Rio), haverá
uma audiência pública no dia 10 de julho, sexta, na Câmara de
Vereadores de Niterói (na Av. Amaral Peixoto), para formalizar o
processo da Conferência Municipal de Comunicação.

Antes ainda
acontece um encontro de formação preparatória para a Confecom
organizado pelo Núcleo Piratininga de Comunicação com o tema ‘Rádio e
TV são concessões públicas. Que processos de concessão queremos?’. A
atividade é 24/06 (quarta-feira) às 19h, no Sindicato dos Engenheiros
(Av. Rio Branco 277, 17° andar – Cinelândia).

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A Universidade não é caso de polícia

12 06 2009

Em vez de estigmatizar os alunos e tratá-los como delinquentes, talvez seja o caso de se perguntar contra o que eles se manifestam.

AS CENAS de batalha campal que vimos nesta semana na USP ficarão na memória daqueles que dedicam sua vida a essa instituição. Vários professores, como eu, que nunca participaram de movimento sindical, que nem sequer foram alguma vez a uma assembleia, veem com estarrecimento a disseminação da crença de que conflitos trabalhistas devem ser resolvidos apelando sistematicamente à polícia.
Diz-se que a polícia era necessária para evitar piquetes e degradações. No entanto, tudo o que ela conseguiu foi acirrar os ânimos e aumentar exponencialmente os dois.
Vale a pena lembrar que, por mais que sejam práticas problemáticas que precisam certamente ser revistas, os piquetes estão longe de se configurarem como ações criminosas. A história das sociedades democráticas demonstra como eles foram, em muitos casos, peças necessárias de um processo de ampliação de direitos. Cabe a nós provar que esse tempo passou e que, devido à capacidade de diálogo, tais práticas não têm mais lugar.
No entanto, quando se tenta reduzir manifestantes que procuram melhorias em suas condições de trabalho a tresloucados patológicos que nada têm a dizer, que não têm nenhuma racionalidade em suas demandas, dificilmente alguma forma de diálogo conseguirá se impor.
Melhor seria começar explicando qual racionalidade justifica que a universidade mais importante do país, responsável por parte significativa da pesquisa nacional, tenha salários menores que os de uma universidade federal em qualquer Estado brasileiro.
Por outro lado, há algo incompreensível na crença de que a polícia possa ser chamada para mediar conflitos com alunos e funcionários públicos. Muitos acreditam que ligarão para o 190 e receberão uma espécie de “polícia inglesa” capaz de agir de maneira minimamente adequada diante de cidadãos que se manifestam.
Contudo, o que vimos até agora foi uma polícia que entrou pela primeira vez no campus armada com metralhadoras, quando a ação padrão deveria ser, nessas situações, agir desarmada. Quem tem uma metralhadora nas mãos imagina que porventura poderá usá-la. Mas contra quem? Contra nossos alunos? E quem decidirá o momento de usá-la?
Como se isso não bastasse, uma polícia bem preparada não responde a provocações de gritos e latas com bombas de gás lacrimogêneo e balas de borracha usadas na frente da Escola de Aplicação e de uma faculdade em que, normalmente, há crianças e adolescentes. O que aconteceria se uma bala de borracha atingisse uma criança, ampliando um pouco mais o enorme contingente de balas perdidas disparadas pela polícia?
Antes de ligar para a Polícia Militar, valeria a pena levar em conta seu despreparo manifesto em intervenções em conflitos sociais, histórico catastrófico mundialmente criticado por órgãos internacionais.
Nenhum leitor terá dificuldade de se lembrar de situações de conflito social nas quais policiais que se sentiram acuados reagiram de maneira descontrolada, provocando tragédias.
Por fim, contrariamente a certa ideia que um anti-intelectualismo militante gosta de veicular nestes momentos, vários alunos alvos de balas de borracha são extremamente dedicados em seus cursos, participam sistematicamente de colóquios e programas de pesquisa, apresentam “papers” em congressos e podem ser constantemente encontrados em nossas bibliotecas.
Sendo certo que vêm de todas as faculdades de nossa universidade (e não apenas da área de humanas, como alguns querem fazer acreditar), é inaceitável tratá-los como delinquentes potenciais. Dentre os 2.000 estudantes que se manifestaram nesta semana estão alguns de nossos melhores alunos.
Em vez de estigmatizá-los, talvez seja o caso de se perguntar contra o que eles se manifestam, já que, é sempre bom lembrar, antes da entrada da polícia, nem professores nem alunos estavam em greve. A greve restringia-se a funcionários.
Há um mês, em uma pequena cidade francesa, a polícia recebeu um chamado de possível furto. Em uma atuação “exemplar”, ela estava em alguns minutos no local do crime. No entanto, o local era uma escola, o objeto furtado, uma bicicleta, e o possível ladrão, uma criança de dez anos. Sem pestanejar, a polícia retirou a criança da escola na frente de seus colegas, levou-a à delegacia, colheu seu depoimento e a fichou.
Possivelmente, foi contra esse modelo social baseado na incapacidade de resolver conflitos sem apelar à mais crassa brutalidade securitária que hoje nossos alunos se manifestam. Cabe a nós mostrar a eles que a história da USP é outra.


VLADIMIR SAFATLE, 36, é professor do Departamento de Filosofia da Universidade de São Paulo.